sexta-feira, 10 de julho de 2015

Confiar

       Posso até estar enganada, mas há quem concorde que vivenciamos um período de crises existenciais nos relacionamentos, sejam eles de vínculo profissional, político ou afetivo, em razão da ressignificação ou insignificância do sentimento de confiança. Eis que me surgem diversas questões: seria esta um estado de consciência ou um título de credibilidade? Exata ou imprecisa? Razão ou emoção? Percepção ou decisão? Onde a encontramos: em si, ou no outro? Seria parte ou o todo? Provém do início, meio ou fim? Há muito o que se questionar e entender para conhecê-la, só tenhamos cuidado para não chegarmos a duvidar da sua existência. Difícil mesmo é enxergá-la após seqüências de decepções e desilusões encaradas ao longo da vida. Difícil de acreditar quando a desmoralização e desvirtuamento tornam-se parte de uma sociedade que insiste em falsificar-se em nome do egocentrismo e das regalias. Difícil, mas não impossível. 

       Sejamos um pouco mais curiosos para buscar entender o que prevalece como mais importante: confiar, ou se fazer confiável? Ser ou demonstrar-se? Será mesmo uma questão de credibilidade? Considero uma via de mão dupla que flui quando a preocupação em não trair é maior do que a preocupação em ser traído, pois quando a preocupação em ser traído prevalecer tenha certeza que não há confiança; quando a hipocrisia submete-se à sinceridade e a integridade preenche-se de fidelidade, assim ela pode existir. No instante em que a verdade prevalece sobre a mentira, quando nos esvaziamos do medo de sentirmo-nos traídos, a confiança nos abriga. Não se revela por meio de meras comprovações e sacrifícios, ocorre em solidariedade, quando os valores próprios sintonizam com o do outro.

       Será que pensamos que erramos ao depositarmos nossas expectativas em algo ou alguém relacionando-as com a confiança? Para aqueles que acreditam que esta seria uma questão de credibilidade, afirmo: depositar expectativas não é um ato de confiar. Se assim fosse, estaríamos descredibilizando-a. Mas por que não? Ou melhor, a pergunta seria: por que nos frustramos? Entender que somos seres falhos nos leva ao amadurecimento de que a confiança é um sentimento inabalável  e não depositado e, simplesmente, desperdiçado. Depositar expectativas é sinônimo de incumbir, acusar, responsabilizar algo ou alguém quando elas não são correspondidas. Você já deve ter escutado a mais pura verdade: ninguém perde o que nunca possuiu. Se perdeu, não sentiu, ou sentiu de forma errada. Será que estamos entendendo o sentindo confiança? Ou melhor, será que sabemos ou aprendemos a senti-la? Acredito que podemos cometer o infeliz erro de confundi-la com a conveniência por estarmos, às vezes, apegados à nos doarmos menos pensando em exigir mais dos outros.

       Seria surreal da nossa parte revoltarmo-nos e apoiarmos-nos na descrença de que não devemos confiar em absolutamente ninguém e em nada na vida, apenas em si. Entendamos que ela é o pivô que harmoniza e concretiza uma relação verdadeira. É lógico que estamos todos vulneráveis às mentiras e à traição, ainda assim, compreendamos que a nossa insegurança não é motivo para bloquear a confiança. Se percebermos a insegurança como um equilíbrio entre a confiança e o seu excesso, passaremos a agir com temperança, seremos responsáveis, seguros, pensaremos de maneira ponderável e cautelosa. Saibamos otimizar os nossos sentimentos, seja ele qual for, e não a suprimi-los, pois assim o aprendizado não fará sentido algum.

       A confiança é livre, mútua e espontânea, por isso precisamos desencarcerá-la quando contaminada por sentimentos como a arrogância, avidez, inveja, intolerância que envenenam o nosso estado de consciência. Entretanto, precisamos mentalizar que a confiança e insegurança andam juntas, embora tenham significados antônimos, são também sentimentos que fazem parte da natureza humana e estes reúnem-se de modo que não se invalidam, mas sim conciliam e equilibram as relações. Contestá-las apenas nos culpabiliza e tortura, pois não se trata de uma imposição e superioridade, confiança e insegurança associam-se com coexistência e coerência. 

       Pensando bem, não precisamos de muitas explicações e orientações já que trata-se de sentimento e racionaliza-lo poderá nos conduzir ao ceticismo e insensibilidade por nos prendermos à comprovaçãos e conceitos. Portanto, encontro todos os meus questionamentos na seguinte frase de Carlos Dummond de Andrade "confiança é ato de fé, e esta dispensa raciocínio".

Por Luiza Rodrigues dos Santos 
10/07/2015

"Um pássaro nunca teme que um galho quebre porque a sua confiança está nas suas próprias asas"